Não quero um amor

       Eu não quero um amor que dure a vida toda. Esse eu tive e tenho – amei, amo, amarei – porém vira amor e só amor não sustenta uma vida a dois. O amor é uma coisa tão grande, tão imensa que às vezes não cabe no casal, ele se expande de uma forma que explode a dupla, que os faz reféns da pureza. E pureza não combina com felicidade. Na vida, se está a dois tem que haver fogo, desejo, vontade e o amor não é capaz de manter tudo sozinho. Ninguém é capaz disso, imagina um sentimento tão nobre?

       Eu não quero um amor que dure alguns anos. Esse vivi, não quero mais. Há uma previsibilidade nesse tipo de amor. Começa num lugar qualquer, num interesse despretensioso, vai pra cama, depois pra lanchonete. Na sequência um segue o outro nas redes sociais e quando se dá conta as farpas estão sendo distribuídas em todos os canais.

         Eu não quero um amor que dure semanas. Só se colhe o bom, sem defeitos, sem problemas, sem reticências. Tudo muito breve para conhecer o outro. Uma rapidez abrupta que deixa o coração dolorido acreditando ser aquele o amor que seria o de uma vida inteira, mas que a razão sabe que não o é.

          Eu não quero um amor que dure dias. A rapidez de sentimentos efêmeros assim não acrescenta em nada na vida de ninguém. Por alguns instantes você se sente vivo, para em uma eternidade estar morto por dentro. Carne podre se decompondo no coração inaudível. Dias são uma quantidade vazia.

           Eu não quero um amor. Eu quero um vento no meu ouvido que me faça sentir-se viva, uma luz que entre no meu quarto e ilumine o cheiro de um sexo bem feito, bem terminado. Não quero companheiro, quero um parceiro de vida. Viajar sozinha e ligar para ele no meio do percurso convidando ao encontro. Saber que posso sentir o que eu quiser, falar o que eu quiser e minha natureza não será capaz de afugentá-lo. Quero um olhar compreensivo e um ataque de ciúmes com uma penetração de sentimentos depois. Quero um café morno, sentar no colo, ganhar o abraço e não querer transar. Quero tomar banho e receber a toalha esquecida, ouvir uma música que me faça lembrar do sorriso, do toque. Quero uma flor não anunciada que derreta minha resistência a todo romantismo. Quero um pouco de tudo, mas não quero um amor.

 

No tremor das palavras

             Você tem um movimento com os lábios que ameaça falar, mas não fala. Eu observo esse detalhe quase imperceptível, eu finjo que não vejo, mas eu vejo e quase encontro as palavras que estão para sair da sua boca. Isso é medo? Talvez eu fale de mais, incansavelmente, e você quer somar a essa ruma de coisas aleatórias que escuta de mim. Talvez você fale demais por dentro e ainda não tenha encontrado o vocabulário adequado para entrar na minha mente maluca que não para de pensar. Talvez você só queira expulsar os demônios que traz dentro de si, um a um, mas se resguarda num medo que é só seu, um medo de me assustar por saber mais que eu. Talvez seja só um tique nervoso e eu seja imaginativa demais.

                Mesmo assim, eu observo essa ameaça de lábios, essa ameaça que se cumpre na barba excêntrica de quem é sempre notado, porém nunca se abre. Uma boca que se abre com intimidade para a cerveja, mas teme a comunicação. Sua comunicação é o álcool? Sim…eu vejo algumas tentativas maiores de comunicação quando você bebe, por alguns instantes há um homem solto que permite as tais palavras flutuarem na boca, o sorriso fácil se espalha pelo ambiente. Um sorriso bonito, vistoso, por vezes descarado, um sorriso que nunca se cansa de beber as impressões dos que estão em volta.

                Seu olhar também sugere ameaças, ao tremer discretamente a boca que não fala, os olhos se comunicam de maneira ardil na tentativa de acidificar o que o vocabulário limitado não permite. Um olhar de análise, por vezes de calma absurda, que incomoda os mais perspicazes. Me incomoda, mesmo eu não sendo a mais astuta. Esse olhar aí aliado à boca que se mexe involuntariamente provoca dúvidas intrigantes. O não-saber do que vem de dentro, a falta de informação. Tudo isso fustiga quem quer entender o não dito. Esse silêncio ou essa verborragia introspectiva me fazem escrava, me perturbam a mente, sacodem o emocional mentiroso faz moradia em mim.

             Uma palavra sua e a calma se instala. A fala cala e silencia minha boca que não para minha mente que só procura respostas para questionamentos que nunca deverão ser elaborados.

AMA(R)turidade

já sei..

Não vejo respostas nessa tela…apagou…

Bebida ajuda, atrapalha, resolve, mete em confusão.

Sendo assim: boa ida ao festival, aproveite muito;

se divirta;

pegue geral (mas não me conte porque o 🖤 de gelo não é de ferro);
lembre-se de se alimentar decentemente ao menos uma vez ao dia (porque sua saúde é importante pra mim);
lembre-se de usar protetor solar, beber bastante água e colocar a carteira no bolso da frente;
fale com estranhos sempre que puder;
faça novos contatos em todos os ambientes;
se alguém precisar de ajuda e puder pegue o pedaço que levou de mim e lembre que você gostaria que fizessem o mesmo;
Beba loucamente, mas não o suficiente para que alguém precise tomar conta de você, afinal eu não tô aí pra ficar do teu lado;
escove os dentes pelo menos uma vez por dia, você não vai querer ir a um dentista aí, né?;
ajeita esse cabelo atrás da orelha, afinal o mundo precisa ver essa beleza que você esconde (a promessa de lhe ensinar a cuidar desse cabelo lindo tá de pé, quando você voltar a gente providencia isso se você quiser);
Fale mais e pare de pensar demais antes de falar, você é um cara incrível, tem conteúdo. Deixa o mundo saber disso. (até vejo sua boca quase se movendo e se arrependendo antes mesmo de dizer);
Por fim, limpa a cabecinha e vai com ela como se nunca tivesse me conhecido (com exceção das minhas duas músicas), porque esse momento é teu, vive com gosto pra me contar depois como foi.

Post-Scriptum (o velho PS): Use camisinha, se voltar com uma DST lhe mando de volta pra Bruxelas!

Adoro não precisar te amar, amo não precisar.

A secura da palavra

      Assim que me deparei com essa obra o título me levou a pensar que, mais que água, algo muito profundo se ausentava nas vidas dos personagens que eu ainda estava por conhecer. Em Vidas Secas, Graciliano Ramos apresenta a introspectiva família sem sobrenome – tudo a que o leitor tem acesso são os nomes de Fabiano (o pai), Sinhá Vitória (a mãe) e Baleia (a cachorra); os filhos são apenas: o mais novo e o mais velho.

      aEssa estratégia faz com que o leitor não se prenda aos personagens, mas à situação de miserabilidade deles. Cada ser que habita o espaço dessa narrativa tem um primitivismo linguístico diametralmente posicionado para lançar o efeito do não-dito. O silêncio e os gestos, sobretudo de Fabiano, denunciam seu interior confuso, que busca a fala encaixada, mas não a consegue: “O único vivente que compreendia era a mulher. Nem precisava falar: bastavam os gestos” (p. 98).

      Essa tentativa de comunicação entre si perturbava a convivência familiar. Numa situação inusitada o menino mais velho descobre o vocábulo “inferno” e ao questionar o significado a mãe lhe pune com um cascudo. Ele incompreende: “Não acreditava que um nome tão bonito servisse para designar coisa ruim” (p. 59).

      Ao que me parece Baleia, a famosa cachorrinha, seria o ser mais comunicativo deste romance. Já nas primeiras linhas ela nos é apresentada em toda sua energia – apesar do contexto de retirantes da seca que mal têm o que comer e se alimentam do papagaio de estimação – e anda fielmente com os seus. Baleia não parece ser propriedade, mas família. Vendo a fome dos membros se atira na aridez dos espinhos para caçar um preá e ficar apenas com seus ossos.

      O mais doloroso dos momentos foi seu destino. A cachorrinha fiel teve sua sina delimitada pela conjuntura da terra batida. Para entenderem melhor, só entrando na casa de taipa e sentando na cama de vara que não agradava em nada Sinhá Vitória. Vidas Secas vai lhe inundar!

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As nuances de um escritor

      Este livro que vos fala – sim, ele fala por si – foi um uma cortesia do escritor Weslley Barbosa para o blog. Há um bom tempo ele figura entre meus livros, mas só escrevo algo sobre ele agora, porque poesia para mim é tempo, é releituras.

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       Antes de As nuances do mel, há um Suspiros Mal-ditos que o antecede. E já se pode falar aqui de um certo amadurecimento na escrita. Mas nada que mude seu estilo da água para a cerveja (não bebo vinho).

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Poema de Suspiros Mal-ditos

      Com nova roupagem, mas no mesmo corpo, a poesia de Weslley traz algo que particularmente me encanta: a escrita contemplativa de 3 versos. Dividido em duas partes: I – Caleidoscópio e II – Hakais, há uma escrita de fôlego, mas paciente.

   Nesta segunda parte, me ative mais detidamente, sou leitora de Haikais e gosto da paciência com que eles são feitos. Foco para este, no formato tradicional 5/7/5, em que tive um certo apego:

      Diante da situação em que nos encontramos, senti a secura das nossas vidas sem a água que precisamos. O eu lírico solta esse labirinto árido aos nossos olhos. O açude que não é mais, o açude que desenha, mas não se inunda.

      Há muito a se falar deste livro, mas não cometeria o pecado de entregar todo o sabor da poesia de Weslley em um único post, nem conseguiria. Indico. É literatura paraibana de bom tom!

Poesia

Leia mais poesia.
Uma vez por dia, tire aqueles 10 minutos em que você poderia estar espiando a vida alheia e troque-os por versos de outrem.
A poesia te conduz a espiar para dentro. Ela pode te embalar no auto-conhecimento.

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Poesia não é narrativa; pode até esse caráter, mas não é. Óbvio? Mesmo tão claro, algumas pessoas não entendem que um livro de poesia precisa ser sentido e experenciado; que você pode ler um único poema várias vezes durante a semana e extrair dele apenas 1% do que ele possa te dar. Vejo metas e quantidades de livros para ver quem ganha na corrida da leitura, pessoas que se propõem a ler 100 ou até 200 livros no decorrer no ano. O que fica desse volume? Se não me falha a memória Paul Valery escreveu certa vez: “prefiro ter um leitor que me leia mil vezes do que mil leitores que me leiam apenas uma vez”.

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